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segunda-feira, 3 de novembro de 2008

E se a Amadora tivesse um autarca de origem africana?!

Hoje estive a "passear" pelo jornal Público e deparei-me com um artigo interessante. É do conhecimento de todos que o Município da Amadora tem uma forte presença de imigrantes, com especial relevo para as gentes de origem africana.

As eleições autárquicas estão próximas e possivelmente não veremos nenhum imigrante nas listas de candidatos. Mas pensemos no que o mundo está a assistir neste momento. Nos EUA há 50 anos era impensável que uma pessoa de origem africana pudesse chegar ao poder e isso está prestes a acontecer, possivelmente já amanhã. Esse senhor subiu a pulso e poderá concretizar o sonho americano. Da Holanda vem outro exemplo de integração e sucesso. Um outro senhor, este de origem marroquina, será o presidente da Câmara de Roterdão a partir de Janeiro de 2009.

Eis o artigo que motivou este "post":

O muçulmano que vai governar a segunda maior cidade da Holanda e não tem medo

Tinha 15 anos quando cheguei à Holanda. Eu, a minha mãe e os meus irmãos deixámos a nossa aldeia de Beni Sidel, nas montanhas Rif, no Norte de Marrocos, em 1976, e fomos para Amesterdão. Juntámo-nos ao meu pai, que tinha sido imã (conduzia preces na mesquita) e havia emigrado na década de 1960 para sustentar a família. Do que deixei para trás, só me lembro de uma pequena casa sem água corrente e electricidade, uma vaca, um burro e algumas pedras.

Não foi fácil a integração, mas não baixei os braços. Formei-me em engenharia e telecomunicações, fui jornalista, assessor de imprensa e relações públicas, fundei e dirigi a organização Forum, dedicada aos problemas do multiculturalismo desde 1998. E aqui estou eu, o primeiro muçulmano designado burgomestre de uma grande cidade da Holanda, neste caso Roterdão, a segunda maior.

A minha nomeação, a 18 de Outubro, já foi confirmada e tomo posse em 1 de Janeiro de 2009. Prometo cumprir até ao fim os seis anos do meu mandato. Fui escolhido pelo meu Partido Trabalhista depois de até adversários políticos terem elogiado a minha "competência, seriedade e eficácia". Primeiro como vereador de Amesterdão e depois como secretário de Estados dos Assuntos Sociais e do Emprego.

Exerci este último cargo desde as eleições legislativas de 2007, no quarto governo do primeiro-ministro Jan Peter Balkenende. Havia outro muçulmano na equipa: o turco Nebahat Albayrak, secretário de Estado da Justiça. Abrimos um precedente, e a extrema-direita, que apenas ocupa nove dos 150 lugares do Parlamento nacional, criticou-nos e continua a criticar-nos por termos dois passaportes.

Alguns acusaram-nos de "criar a aparência de dupla lealdade". Mas que fazer, se Marrocos e a Turquia não permitem que optemos por uma só nacionalidade? O mesmo acontece com a princesa Máxima, mulher do herdeiro do trono holandês, Willem Alexander, que mantém o seu passaporte argentino.

Agora, Geert Wilders, líder do partido anti-imigração PVV, ironiza que "escolher um muçulmano para burgomestre de Roterdão é tão ridículo como nomear um holandês para presidente da Câmara de Meca", na Arábia Saudita. E disse mais: "Roterdão vai tornar-se uma Rabat e, em breve, vamos ter um imã a servir de arcebispo. É uma loucura!" Perante estas afirmações, quero recordar que, em 2004, quando um extremista da minha comunidade marroquina matou o cineasta crítico do islão Teo Van Gogh - alvejado com sete balas, esfaqueado nas costas e degolado até quase ser decapitado - tive a coragem de gritar, do púlpito de uma mesquita, que todos aqueles que não aceitarem os valores de liberdade deste país que os acolheu devem fazer as malas e partir imediatamente.

Por causa dessa atitude, puseram a circular na Internet e enviaram-me cartas iguais à que foi cravada com duas facas no torso de Van Gogh. Chamaram-me apóstata, herege e traidor. Não me deixei intimidar. Não tenho vergonha de assumir que sou um muçulmano praticante, mas também não hesito em defender a separação entre Estado e religião.

Em Amesterdão
Naquela altura eu era vereador da Educação, Juventude e Diversidade em Amesterdão. Percorri durante vários dias as ruas da cidade para tranquilizar os espíritos, para impedir que o ódio e a revolta resvalassem para a violência. Ganhei o respeito de todos, porque compreendo muito bem o que aqui se passa.

Chamam-me "imigrante modelo" e "modelo de inspiração" e, parte desses elogios ganhei-os pela forma invulgar com que agi. Por exemplo, eu ia pessoalmente à casa dos munícipes para ter a certeza de que não recebiam subsídios indevidos. Queria ter a certeza de que as oportunidades oferecidas pelo Estado eram merecidas.
Deixem-me que compare os imigrantes de ascendência turca e marroquina do meu tempo aos judeus portugueses que chegaram a Amesterdão há 300 anos. Estes firmaram-se como uma comunidade florescente e deixaram marcas históricas na nossa cidade com uma bela sinagoga.

Foram necessárias gerações para que os judeus se instalassem na sociedade de Amesterdão e subissem aos importantes postos que têm assumido nas últimas décadas. Os descendentes desses imigrantes portugueses ainda hoje são parte da elite administrativa, académica e económica de Amesterdão. Em 300 anos, passaram de imigrantes a detentores de cargos importantes por nomeação real.

Também os imigrantes marroquinos e turcos de Amesterdão deram um gigantesco passo em frente. Nos anos 1960 e 1979, muitos vieram de áreas rurais, tradicionais e não industrializadas. Foram recrutados por grandes companhias em busca de mão-de-obra barata. Um grande número era analfabeto. Não obstante as adversidades, membros desses grupos imigrantes (da primeira e segunda gerações) já se tornaram membros influentes da nossa sociedade.

Em todo o caso, apesar desta elevação social, muitos problemas persistem, sobretudo com a segunda geração que ainda não foi integrada no sistema educativo e no mercado de trabalho. Muitos jovens sentem que, apesar dos seus esforços, nunca foram aceites. Devemos temer que eles se radicalizem e enveredem por actividades terroristas? Creio que não devemos generalizar, porque a diversidade desta segunda geração é enorme. Não devemos categorizá-los como um grupo separado, mas enfatizar que fazem parte da nossa sociedade.

Nós e eles
Tenho medo, é verdade que os imigrantes da primeira, mas sobretudo da segunda geração, se aproximem mais dos seus países de origem do que dos Estados onde vivem. Os jovens parecem sentir-se atraídos por uma imagem romantizada da sua identidade e raízes. Alguns abraçaram o islão ortodoxo para aumentar a auto-estima e não participam na sociedade. Ora, quando começam a virar as costas à sociedade, as pessoas vivem realidades separadas, criam as suas próprias histórias e percepções. Isto conduz a uma polarização, provoca tensões e medos. Essa realidade leva-nos a pensar em termos de "nós" e "eles", mas o que temos de fazer é conhecermo-nos uns aos outros e as nossas diferentes histórias.

Também estou inquieto com a dureza do debate sobre o islão na Europa e a "integração dos muçulmanos" nas sociedades urbanas europeias. Tenho visto políticos a usarem a religião e o medo para chegarem ao poder. Isto é uma ameaça à Europa e aos ideais europeus. Processos de polarização e de perda da confiança mútua são um resultado amargo quando os políticos se deixam guiar por objectivos populistas.

É tão fácil criticar o islão ou fazer das comunidades imigrantes um bode expiatório para conquistar mais votos. No entanto, isso causa danos e tensões desnecessárias. Compreendo que muitos jovens sintam que não são aceites nem têm a perspectiva de um futuro brilhante.

O desafio de Roterdão
Falei sobre estes problemas, mais centrados em Amesterdão, quando estive em Lisboa, em Outubro de 2006, na 11ª Conferência Metropolis. Agora vou para Roterdão, outra cidade portuária da Holanda e talvez ainda mais complexa. Dos seus 600 mil habitantes, cerca de 47 por cento são originários de uns 180 países. Há muitos problemas sócio-económicos, incluindo crimes, envolvendo as comunidades migrantes, o que agrava a discriminação.

O segundo maior partido da cidade é o Leefbaar Rotterdam (LR), herdeiro da lista fundada pelo activista da extrema-direita Pim Fortuyn, assassinado em 2002 por um activista dos direitos dos animais que justificou o ataque com a "exploração dos sectores mais fracos" por parte daquele político. A minha designação como burgomestre foi duramente criticada pelo novo líder, Ronald Sorensen.

Na Holanda, embora os presidentes de câmara sejam, tradicionalmente, nomeados pela rainha por recomendação dos partidos, nos últimos meses várias cidades, como Ultrecht e Eindhoven, adoptaram a eleição por referendo. Ou seja, os cidadãos podem optar entre dois candidatos de uma short list. No meu caso, eu nem sequer constava de uma short list e o Leefbaar Rotterdam insistia num referendo. O Partido Trabalhista (PvdA), que é desde 2006 o maior bloco no conselho comunal (18 dos 45 lugares, contra 14 do LR), conseguiu impor a sua vontade, e Sorensen ficou furioso.

Eu, pela minha parte, fiquei muito feliz por ir substituir Ivo Opstelten, que esteve no comando durante dez anos desta cidade muito especial, com gentes diversas e uma grande história. E desconfio que as principais razões para o Leefbaar Rotterdam não me aceitar sejam outras que não o facto de eu ser muçulmano e ter dois passaportes. Reparem no que disse Sorensen: "Ahmed Aboutaleb é um tipo que vem da rival Amesterdão e, mais grave, apoia o Ajax [equipa de futebol local] em vez do nosso Feyenoord."

Não tenho medo. Aos 48 anos e com pelo menos 45 por cento dos holandeses a manifestarem-me o seu apoio nas sondagens, vou continuar a seguir o meu método de trabalho que é o da negociação - uma das principais características do islão. E não me importo que me chamem "o sultão de Roterdão".

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Fonte: Público, 01-11-2008

1 comentário:

RH disse...

O meu coração transbordaria de alegria e felicidade em ter um "Obama" à frente da autarquia da Amadora. I have so many dreams...