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sexta-feira, 6 de fevereiro de 2015

Je suis marquise

Portugal tem nome, corpo, alma e sangue de marquise. Começa no nome. O "mar quis e"... Portugal foi, como diria o nosso poeta-marquise. Temos sido o que o mar quer, quando quer.

Depois é o corpo. Portugal tem corpo de marquise. Está-se mesmo a ver que quando Deus desenhou a Europa havia ali uma linda varanda, um retangulozinho quase perfeito a começar na Galiza e a acabar no mar em Sagres, até que foram chegando os portugueses, ficaram, arrastaram os pés, e quando Deus estava a descansar, fecharam a marquise e ficaram lá dentro... Dentro, mas a olhar para fora. Portugal é a marquise da Europa.

Marquise no nome, marquise no corpo, mas na alma, alma de marquise. Marquise é achar-se mais esperto do que o arquiteto e do que o engenheiro, que sabem lá de térmica ou de acústica, de plantas ou projetos, ou de como uma casa dever ser vivida. Passam a vida em gabinetes, gente rica que acha que nos podemos dar ao luxo de uma varanda, de desbaratar aqueles preciosos seis, sete metros quadrados de estufa. Mas os arquitetos e engenheiros sabem bem que se a marquise viesse de origem não era a mesma coisa. Marquisar uma casa é o piercing na sobrancelha, a rebeldia metálica à flor da fachada, a individualidade em cada centímetro de alumínio. O português tem prazer neste tuning imobiliário, a sua casa torna-se mais sua, mas também mais casa.

Marquise é mais casa, mas não é só mais casa, é mais casa roubada, mais casa que o português a palmo conquistou à rua, ao Estado, à natureza, aos outros. O português nunca perde uma varanda, ganha uma marquise, porque em Portugal não há varandas, há marquises em construção. Por isso, não se tapam varandas, fecham-se marquises. Fechar a marquise... Aos olhos do dono, a marquise antes de ser já o era, já lá estava, linda, um holograma projetado pelo seu coração.

Somos sempre marquise por outra coisa, não pela marquise em si, mas pelo frio, ou pelo barulho, ou pelo calor, ou porque é naquela gaiola de vidro e alumínio que o miúdo agora é que vai estudar mesmo bem, sossegado, numa escrivaninha de pinho de arestas agudas, mesmo a calhar num dos topos da marquise, ao fundo, pouco importa que escorra água e frio no inverno, ou calor no verão, porque a marquise é o sítio ideal para fazer os deveres. Ou para estender a roupa. Ou para a cama de um filho com que não se estava a contar. Ou para o tanque da roupa. Ou para passar a ferro. Ou para espaço de arrumos. Até lá cabe a sogra, que desde que enviuvou agora vive connosco.

Marquise é transgressãozinha generalizada, é desafiar leis e regulamentos com a convicção do bem. Exportámos este delito de marquise. No Brasil, tem fechamento de varanda, e tem cortina de vidro para o rico. Cortina de vidro é mais legal, ou melhor, é mais bacana, porque legal legal também não é bem, apesar de a prefeitura do Rio, ao fim de dez anos de discussão, ter aprovado o regulamento de legalização. Por cá, tentou-se legalizar a marquise, tentou-se na Amadora, tentou-se em Oeiras, Isaltino de Morais tentou, mas nada. Marquise legal não é marquise, é janela. E para legalizar tem de pagar, e o português prefere que lhe paguem. Há uns anos, Julieta Rocha, ao Público, disse tudo: "Esta marquisezinha custou-me 118 contos e dá-me muito jeito. É uma despensa que eu aqui tenho. Esta custou-me 51 contos. Legalizar as marquises?! Deviam era ter-mas pago." E virá um dia em que teremos o cheque-marquise, o fundo-marquise, o QREN-marquise, o programa-marquise, a DGM, m de marquise, o plano operacional-marquise, o benefício fiscal para investimento em marquise. Todos somos marquise.

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Fonte: Diário de Notícias, 22-01-2015

1 comentário:

Anónimo disse...

vous êtes Ressabiado!